
Os países da América Latina e Caribe precisam investir entre 1,5% e 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB) ou de 5% a 10% do gasto público anual em políticas de proteção social para eliminar a pobreza. Essa recomendação está no estudo América Latina e o Caribe 30 anos após a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Social: rumo a um pacto mundial pelo desenvolvimento social inclusivo, apresentado nesta terça-feira (2), na VI Conferência Regional sobre Desenvolvimento Social da América Latina e do Caribe, promovida pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), em parceria com o governo do Brasil e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).
Ao apresentar o documento, o diretor da Divisão de Desenvolvimento Social da Cepal, Alberto Arenas de Mesa, destacou a necessidade de buscar mecanismos de financiamento para enfrentar a pobreza nessas regiões.
“Se não mudarem o que está sendo feito para enfrentar a pobreza, a região vai demorar mais de 30 anos para cumprir o objetivo de erradicá-la. Da mesma forma que existem padrões de investimento em saúde, na educação e, também, padrões de como gastar com a infância, é necessário que a região avance em um padrão de investimento público na proteção social não contributiva”, defende.
O encontro em Brasília serve como preparação para a segunda Cúpula Mundial para o Desenvolvimento Social 2025, que acontecerá em Doha, no Catar, entre os dias 4 e 6 de novembro. Essa edição ocorre 30 anos após a primeira, realizada em 1995, em Copenhague, na Dinamarca.
Além disso, o evento marca o início da nova presidência rotativa da Conferência Regional sobre Desenvolvimento Social da América Latina e do Caribe, liderada pelo Brasil no período de 2025 a 2027.
Mapa da Fome
Ao falar sobre os esforços latino-americanos em políticas de desenvolvimento social inclusivo, o ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), Wellington Dias, afirmou que apresentará em Doha as iniciativas do governo federal que, pela segunda vez, retiraram o Brasil do Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), em julho.
“O que o Brasil fez sobre a presidência de Lula, de janeiro de 2023 para cá, foi tirar da fome um Maracanã [estádio de futebol], cerca de 60 mil pessoas, por dia. Ou seja, pessoas que não tinham o café da manhã, o almoço e não tinham a certeza da janta, passaram a ter segurança alimentar. Mais do que isso, passaram a ter proteção social”, afirmou.
O indicador global da ONU aponta países com insegurança alimentar crônica. O Brasil saiu do Mapa da Fome, conforme relatório apresentado na Cúpula de Sistemas Alimentares da ONU (UNFSS+4), em Adis Abeba, na Etiópia.
No Plano Brasil sem Fome, Wellington Dias destacou o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), os benefícios do programa Pé-de-Meia, a Tarifa Social de Energia Elétrica para famílias no Cadastro Único (CadÚnico) e o Auxílio Gás.
“Tiramos 29,4 milhões de pessoas da fome e, também, tiramos, aproximadamente, 10 milhões de pessoas da extrema pobreza. Saímos daquela situação de pessoas na fila do osso para tê-las no supermercado, no açougue, não só para se alimentar, mas para se alimentar bem. Com alimentos saudáveis”, disse Wellington Dias.
Multilateralismo
Na abertura da VI Conferência Regional, o ministro disse ter a “consciência de que o Brasil assume a presidência desta conferência em um contexto internacional conturbado, marcado por crises políticas, conflitos e ameaças à estabilidade e ao desenvolvimento social”.
Por videoconferência, José Manuel Salazar-Xirinachs, secretário-executivo da Cepal, destacou que a conferência acontece em um momento crucial.
“A combinação de novas tendências tecnológicas, demográficas e ambientais, com novas condições geopolíticas e geoeconômicas mundiais, faz com que este momento seja propício para repensar paradigmas de desenvolvimento em geral e de desenvolvimento social, em particular”, avaliou.
A ministra de Desenvolvimento Social e Família do Chile, Javiera Toro, representante do país que liderou a Conferência Regional sobre Desenvolvimento Social da América Latina e do Caribe no período de 2023-2025, expressou preocupação com o avanço do unilateralismo no cenário global, resultando na perda de apoio à cidadania e no enfraquecimento de alianças.
Segundo a ministra chilena, é fundamental valorizar o sistema de proteção integral e promover a cooperação para fortalecer o desenvolvimento social, inclusivo e resiliente, reafirmando o compromisso contínuo com o multilateralismo e a integração regional.
“A cooperação Sul-Sul deve ser alinhada com o fortalecimento de diferentes espaços de cooperação. Temos a convicção que, a partir da América Latina e do Caribe, nós podemos contribuir muito sobre como abordar os desafios que nós enfrentamos: o baixo crescimento econômico, alta desigualdade, crise climática, e capacidades institucionais frágeis”, afirmou.
Em conversa com a Agência Brasil, Silvia Rucks, coordenadora residente da ONU no Brasil, destacou que os desafios econômicos, sociais e ambientais enfrentados globalmente são imensos, mas ressaltou que o diálogo entre as nações é a chave para superá-los.
“Eu cito as palavras do meu chefe, o secretário-geral da ONU, António Guterres, que fala que a única maneira [de avançar] é pensar no coletivo”, disse.
A coordenadora da ONU no Brasil mira a 80ª Assembleia Geral das Nações Unidas, este mês, em Nova York, com representantes de todos os Estados-membros, para a retomada do diálogo e como forma de revitalizar o multilateralismo.
“É um momento único, especialmente para o multilateralismo, para trazer essa vontade de ver como o mundo pode avançar para suas melhores condições”, defende a uruguaia Silvia Rucks.
Aliança global
Segundo a organização do encontro, este é um apelo da América Latina e do Caribe pela aprovação de um pacto global para o desenvolvimento social inclusivo durante a segunda Cúpula Mundial para o Desenvolvimento Social.
O ministro Wellington Dias destacou a importância da Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza, lançada pela presidência brasileira do G20 em novembro passado. A iniciativa busca mobilizar recursos e conhecimentos para implementar políticas públicas e tecnologias sociais comprovadamente eficazes no combate à fome e à pobreza global.
“A erradicação da pobreza e da fome, em primeiro lugar, depende de uma decisão política. É preciso ter a coragem de colocar os mais pobres no orçamento”, defendeu Wellington Dias.
Segundo o ministro, em menos de 10 meses a aliança global progrediu no apoio à criação e execução de diversos programas de grande escala voltados para o desenvolvimento social.
Ele destacou que é preciso envolver representantes de outras regiões do mundo nesse propósito.
“A Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza é um exemplo de que a esperança pode conquistar espaços, mesmo num contexto difícil. Já somos 197 membros em todo o mundo”, lembrou o ministro.
A VI Conferência Regional sobre Desenvolvimento Social da América Latina e do Caribe acontece até quinta-feira (4), reunindo representantes de organismos internacionais, acadêmicos e membros da sociedade civil, com o objetivo de promover um desenvolvimento social mais inclusivo, justo e sustentável.